Enquanto uns têm muito e não fazem nada, outros não têm nada e fazem de tudo. Assim é a vida da maioria dos brasileiros. A classe miserável dos setores ativos das cidades grandes é maior a cada dia.
O berço de ouro de uma criança recém nascida é o colo da mãe, no relento. A chuva, o sol, o vento e todos fatores da natureza acompanham a caminhada dessa nova vida que não sabe o quão será seu futuro, se tiver futuro.
Os latões de lixo fazem muitas pessoas ganhar o pão de cada dia. Dali são retiradas latas de refrigerante, cerveja, suco, garrafas de plástico e tudo que pode ser reutilizado.
O Sr. Chico conhece essa história de cor e salteado. Todo o dia acorda cedinho e antes das nove horas já está em seu escritório. Maior que o gabinete do Presidente Luis Inácio Lula da Silva. Têm telefones por todos os lados, pessoas que não trabalham lá, podem passar, parar, sentar e até telefonar. Seu chaveiro carrega pelo menos cinquenta chaves todos os dias. E ele sabe diferenciar a chave de cada carro que está em suas mãos. Sempre almoça em locais diferentes. Conhece muita gente, tanto rica quanto pobre. Então você pergunta: Quem é o Sr. Chico?
Ele cuida dos carros dos prédios vizinhos ao estacionamento público em que trabalha. Ainda por cima, é subordinado por outro senhor que toma conta dos carros do mesmo local. Seu escritório é o estacionamento, seu telefone é o orelhão público e o chaveiro o qual carrega, contém as chaves dos carros, que com tanto carinho e dedicação sabe cuidar. Seu Chico lava os carros e é pago por isso. Seus companheiros de rotina utilizam a água da lavagem dos carros para lavar as mãos. Passam a mão em um balde com sabão e enxáguam no outro com água "limpa".
Esses relatos não acabam por aí. Outro senhor, às quatro horas da tarde, meio embriagado, tomava seu banho. Apanhou a bucha do Seu Chico e começou a lavar os pés, insatisfeito, lavou as pernas também. Parecia lavar uma panela de leite quando está muito pregada. A força de suas mãos parecia que a qualquer momento iriam arrancar seu couro.
A vida para esses e muitos outros não é fácil, muito menos gratificante, passam por humilhações de pessoas que não entendem a verdadeira razão de sobreviver. Isso não acontece somente no escritório do Seu Chico, ou para quem quiser, no estacionamento do Seu Chico. Nas cidades grandes a miséria é explícita, enquanto no interior desse mundão, os pobres se escondem e dizem ser felizes.
(Texto feito por Gisele Peixoto em 2001 - Veja há quantos anos a realidade brasileira continua da mesma forma. Até quando vamos aturar isso? Até quando muitos viverão às margens da sociedade e tentarão sobreviver de forma injusta? Vamos refletir e tentar mudar o futuro do país que vivemos).